segunda-feira, julho 10, 2006

SEBOS: do popular ao luxo

*(IMPRESSO)

Texto e Foto: INGRID GUERRA





Em frente ao hotel que serviu de última morada a um grande poeta; sob um ícone da cidade, numa movimentada esquina da capital; nas ruelas que formam o centro ou nos endereços virtuais da web. O domicílio nem sempre é relevante, o produto vendido por eles, sim. Guardadores de raridades ou simples redutos de “velharias” literárias, os sebos atraem não apenas pessoas que procuram livros fora de circulação e preços baixos, mas, entusiastas da leitura.
Para estes bibliófilos o valor de uma primeira edição é inestimável, embora as cifras reais sejam bastante significativas. Os três volumes de Ulysses, de James Joyce (em uma versão alemã de 1927), por exemplo, chegam a custar R$ 4 mil. E a Mensagem ao Congresso Nacional – apresentada pelo presidente da república por ocasião da abertura da sessão legislativa de 1951 – autografada por Getúlio Vargas, sai pela bagatela de R$ 3 mil.
Já aos demais mortais, sem condições de desembolsar tais quantias, há opções bem mais em conta. Com ofertas até 50% inferiores aos preços negociados em livrarias, os sebos conquistam consumidores de todas as idades e classes sociais: dos acadêmicos em busca de fontes científicas aos estudantes do ensino médio ou pré-vestibulandos que desejam adquirir livros didáticos ou exemplares da lista de leituras obrigatórias.
O livreiro Guilherme Matzenbacher, proprietário da Livraria Mosaico: novos & usados, declara que a demanda por exemplares dessa natureza é considerável: “Uma grande parcela das pessoas que entram no sebo solicitam material didático. E tão logo as listas de leituras para o vestibular são divulgadas começam as buscas. Até porque os professores que as elaboram dificilmente se preocupam em saber se a obra ainda esta sendo editada”.
A falta de reedições atrapalha não apenas os estudantes, mas também a enfermeira aposentada Beatriz Hettwer. “Tentei adquirir exemplares sobre comunismo e socialismo, sem nenhum sucesso, em diversas livrarias. Nem sob encomenda eu consegui. Algumas coisas, realmente, você só consegue em sebos”, declara ela que faz pesquisa para escrever seu primeiro livro.
Com o auxilio da tecnologia, no entanto, o garimpo de Hettwer pode ser menos desgastantes. Afinal, a comunidade sebista tem se empenhado em informatizar seus negócios, oferecendo sites com acervo completo em bancos de dados organizados e de fácil acesso, quando não o e-mail.
Na
Traça – sebo online da Livraria Ex Libris – o internauta pode consultar mais de 30 mil títulos, pesquisando por seções, autores, coleções etc, e ter a sua disposição fotos e descrições sobre o estado de preservação dos mesmos. Para a proprietária da Ex Libris, Carmem Menezes, a Internet é um facilitador: “O nosso cliente, não todos, mas uma grande quantidade, antes de vir a loja consulta o site para saber o que têm. Assim, tudo fica mais rápido, mais fácil do que de repente tu ir a um sebo, que tu vai ter que entrar e procurar sem saber se vai mesmo encontrar o que tu quer”.
E para os mais curiosos a traça oferece ainda exposições de revistas antigas e um blog no qual Carmem Menezes tem um contato mais informal com o público e pode discorrer a respeito do mercado e de sua rotina de alfarrabista.


* Matéria Publicada no Jornal da Manhã - um dos periódicos da Famecos - em Junho de 2006

PÂNICO QUANDO O TELEFONE TOCA

O simples som do aparelho é capaz de provocar arrepios de medo em pessoas com telefonofobia


*(IMPRESSO)


Texto e Foto: INGRID GUERRA






Trimmmm! O telefone toca. Do outro lado da linha alguém busca informação, deseja fazer um pedido ou apenas dizer olá. Enquanto ele espera ser atendido, reações físicas incomuns ocorrem aqui, no lado inverso. Pânico, calafrios, náuseas, falta de ar. Estes são alguns dos sintomas citados por membros da comunidade Eu odeio telefone, no site de relacionamentos Orkut.
Essa angústia pode refletir mais do que uma simples aversão ao som do aparelho criado por Alexander Graham Bell, no século XIX. Principalmente quando sensações desta natureza são percebidas, também, no momento em que deveria ser realizada uma ligação. Por vezes elas indicam o Transtorno de Ansiedade Social.
Conhecido, popularmente, como Fobia Social, se caracteriza pelo medo intenso de ser avaliado por outros e/ou ser humilhado em público. A ansiedade pode se manifestar com palpitações, vertigens e sudoreses, assim como ser circunscrita (ocorrer apenas em algumas situações) ou generalizada (em qualquer contexto social).
A Fobia Social é o terceiro transtorno psiquiátrico mais comum, sobretudo em áreas urbanas. Sua prevalência é em torno de 13%. Afeta homens e mulheres, em geral inicia na infância ou no começo da adolescência. Só nos Estados Unidos acredita-se que 15 milhões de indivíduos apresentem esta forma de inquietação. No Brasil não há dados específicos do quanto freqüente é a doença. Todavia, as estimativas são altas.
Uma breve busca no Orkut pode ser reveladora. Em uma comunidade denominada Eu não sei falar ao telefone, 12.110 pessoas estão cadastradas. Embora a alcunha não seja tão especifico quanto a Eu odeio telefone (8.893 membros), sua definição indica que seus integrantes possuem grandes chances de entrar para as estatísticas: "Seu coração bate de uma forma estranha quando toca o telefone? Você não atende o telefone quando está sozinho em casa? Você detesta ouvir "é pra você"? As pessoas vivem te enchendo porque você nunca liga para elas? Você simplesmente ODEIA falar ao telefone? Você se acha um anormal por causa disso?"
A psicóloga Luciane Benvegnú Piccoloto, membro do Centro de Psicoterapia Cognitivo-Comportamental, revela que existe uma tendência a se menosprezar os medos fóbicos: "as pessoas costumam demorar a procurar tratamento porque acham que são mais quietas ou os indícios sejam reflexos de uma timidez". Assim, é possível ficar até 25 anos com a doença, segundo dados epistemológicos, e só então conseguir uma melhora.
No entanto, é importante analisar bem os sintomas, evitando deste modo a incidência de erros. Para saber quando a animosidade está ultrapassando o medo é necessário avaliar o grau de prejuízo funcional que o indivíduo está tendo. "As pessoas têm todo um arsenal para evitar falar ao telefone. Pedem que outras façam as ligações, despendem tempo arquitetando maneiras de fugir da situação, ou até perdem alguma oportunidade com suas estratégias de evitação", explica Luciane.
Este é o caso do professor de alemão, S.D. "Eu tento fugir ao máximo de ligações. Invento mil desculpas para não fazê-las. O que já fez com que perdesse algumas oportunidades de emprego. Mas, quando ligo, depende do meu estado na hora, consigo abstrair o nervosismo. Quando não, gaguejo bastante, suo e o coração acelera".
Em situações específicas é possível contar com a ajuda de betabloqueadores (substâncias usadas no tratamento da hipertensão, que agem no sistema nervoso autônomo) para atenuar os sintomas físicos. Entretanto, o tratamento vai depender de cada caso. Podendo ser feito através de Terapia Cognitivo-Comportamental (individual ou em grupo) e/ou com psicofármacos (antidepressivos, ansiolíticos).
A Fobia Social tem tendência a cronicidade, ou seja, não possui cura. Mas é possível obter melhoras significativas e alívio do sofrimento. Apesar de parecer difícil para o paciente, as técnicas de exposição e relaxamento, aliadas a psicoeducação (onde se aprende o que é o transtorno, como ele se desencadeia etc) demonstram ser as mais eficazes na retomada de uma vida normal.
Enquanto isso não ocorre o telefone permanece tocando. Trimmm! Trimmm! Trimmm! E continuará assim, a não ser que uma atitude seja tomada. O primeiro alô é só o início da jornada. Neste mundo cada vez mais ligado à comunicação não há como escapar, até uma matéria pode te por em uma roubada. Afinal, a confirmação de uma entrevista é por telefone, marcada.

Leia abaixo depoimentos de pessoas com dificuldade de ser relacionar via telefone.


"Seja o que Deus quiser"

"Minha timidez se manifesta muito quando preciso ligar para alguém. Várias vezes eu anoto o que quero perguntar, mas, isso não adianta, é até pior porque o nervosismo é maior por eu estar claramente agindo como se aquilo fosse uma coisa muito difícil. Por isso, em certas vezes eu simplesmente pego o telefone, ligo, e seja o que Deus quiser".


S. D., tem 27 anos, mora em Florianópolis e trabalha como professor de Alemão

"Silêncio Constragedor"

"Sou péssimo em diálogos ao telefone. Ali, a única atividade possível é falar, falar, falar, falar... Enfim, sou bem reservado. Odeio o caráter 'imediatista' destas conversas em que os diálogos são um 'toma lá, dá cá', e exigem respostas instantâneas, parecendo um interrogatório. Não sou espontâneo, não tenho assunto e muitas vezes não sei o que falar. Sou um especialista no quesito 'silêncio constrangedor'". Também não suporto telefone celular. Não me agrada a idéia de ser 'monitorado'".

Antonio Jin, tem 33 anos, mora em São Paulo capital e trabalha como administrador.


"Medo de notícias Ruins"

"Não tive telefone na infância porque era muito caro. Na adolescência, quando meus pais compraram, as ligações tinham um alto custo, era inconveniente falar muito. O telefone era usado só para assuntos diretos e muito importantes. Assim, ele acabou ganhando uma conotação de 'notícias ruins'. Então nunca consegui ter uma boa relação com o aparelho".

Cláudio Guirunas, tem 26 anos, mora em Florianópolis e trabalha como programador (web).


* Matéria publicada no Jornal da Manhã - um dos periódicos da Famecos - em Junho de 2006

TEMPO

* (CRÔNICA)
INGRID GUERRA

Tempo para mim sempre teve uma conotação particular. Desde os meus 16 ou 17 anos corro atrás dele. É estranho falar isso, mas, com essa idade já me sentia uma velha. Esse sentimento não era vão. eu era, realmente, a mais velha da turma. Não obstante a diferença etária era aceitabilíssima, um ou dois anos no máximo. O problema é que para mim essa disparidade era absurda. Corria atrás do tempo sem nunca alcançá-lo.
Pensava... Estou perdendo tempo, eu preciso tomar decisões, as pessoas mais jovens já descobriram seu rumo. Meu Deus, o que eu vou fazer? O que eu vou ser? Que futuro eu vou ter?
Eu estou velha demais pra tantas coisas! Eu preciso de mais tempo... tempo, tempo, tempo. O tempo corre, os minutos passam, as horas voam, o ano acabou. Meu Deus, o que fiz do meu tempo? Meu tempo passou? Será que terei tempo para tudo? É tarde demais, preciso me organizar. O prazo acabou, quero que o tempo não passe.
Olho o relógio, ouço o tic-tac... não vou conseguir, o dia nasceu, a hora passou, o prazo encerrou. Eu quero mais tempo. Tempooooooo!
Preciso de tempo. Estou velha demais. Não tenho tempo a desperdiçar. Vinte e um, vinte dois, vinte três... Nãoooo! Pára! Eu preciso de tempo, preciso crescer, preciso aprender, preciso amadurecer, preciso me encontrar e encontrar o prazer de viver.
Eu preciso de tempo, tempo para ler, para refletir, para entender, para descomplicar, para amar, para me divertir, para sair, para curtir. Mas o tempo não pára, o tempo só passa. O tempo não me espera chegar. E eu preciso tanto alcançar o meu tempo. Deixar o passado, esquecer o porvir, e viver o presente que o tempo me reservou.


* Escrita em 2005

Olhos Atentos

* (CRÔNICA)

Por: INGRID GUERRA

O florescer dos jacarandás que ocupam a Praça da Alfândega revelam: em breve estarão circulando por ali milhares de pessoas. Muitas mais do que as passam diariamente. Olhos atentos...
É a folgada Feira do livro que vem se adonar de cada pequeno espaço existente entre as árvores, comenta alguém. Livros de todos os gêneros, para todos os gostos, ficam ali, expostos a olhos ávidos pelo momento da posse. Que por muitas vezes pode nem vir a acontecer, mas que se deixam degustar.
São eles que disputam um lugar em frente às bancas, ao lado de olhos curiosos. Olhos que procuram sem achar. Olhos que buscam um não sei o quê, escrito por não sei quem, editado não sei onde.
Os olhos de paixão também estão por lá. Mas estes se quer desviam o olhar. Para os livros, não há porque parar, quando o que desejam está ali, a um palmo do beijo que irão saborear. E este é o que todos irão invejar. Olhos de cobiça irão se aguçar. Os de preguiça não irão nem notar. E os pessimistas, com certeza irão proclamar: é só mais uma conquista, que logo irá acabar. Olhos negros, olhos verdes, olhos que não podem olhar. Todos olham, todos esperam encontrar.


* Produzida em Novembro de 2005